quinta-feira, 30 de abril de 2009

A arte de escrever de Arthur Schopenhauer


Apesar de não ser um título real de Arthur Schopenhauer, A arte de escrever é uma coletânea de escritos do filósofo alemão.

Foram retirados do livro Parerga und Paralipomena, de 1851, e organizados por Pedro Süssekind.

E em razão dessa errônea escolha de título pela editora porto-alegrense, o livro fica como que devendo a suposta arte de escrever.

Mas, em breves doses homeopáticas, o livro oferece todo o sarcasmo, limpidez e concisão do pensamento de Schopenhauer sobre leitura, escrita e linguagem. Ah sim, e também sobre o amor.

Para começar

Schopenhauer é o estereótipo do alemão grosso. Fico imaginando ele falando pessoalmente o que ele pensa e escreve. Devia ser um episódio cômico. E objetiva e subjetivamente incomodativo para os que o escutavam.

Em geral, estudantes e estudiosos de todos os tipos e de qualquer idade têm em mira apenas a informação, não a instrução. Sua honra é baseada no fato de terem informações sobre tudo […], sobre o resumo e o conjunto de todos os livros. Não ocorre a eles que a informação é um mero meio para a instrução, tendo pouco ou nenhum valor por si mesma.

Às vezes, em alguns trechos do livro, pode-se ter a impressão de se estar lendo apenas clichês batidos em qualquer aula de comunicação, letras, lingüística. Mas, para alguém que escreve no século retrasado, em pleno surgimento da literatura de massa, as críticas ferozes e diretas, especialmente dirigidas aos deuses das academias de letras alemãs, são totalmente bem localizadas temporalmente.

é para o café; além disso, em geral não se pode confiar que estejam corretas.
Tenham mais honra no corpo e menos dinheiro nos bolsos e deixem os ignorantes sentirem sua inferioridade, em vez de fazer cortesias às suas carteiras.

Todo autor se torna um escritor ruim assim que escreve qualquer coisa em função do lucro. As melhores obras dos grandes homens são todas provenientes da época em que eles tinham de escrever ou sem ganhar nada, ou por honorários muito reduzidos.

Os escritores que não sabem latim não passarão, em pouco tempo, de fanfarrões aprendizes de barbeiros.

Para os autores gregos e latinos, as traduções alemãs são um substituto tão bom quanto a chicória

Sobre a leitura

Não há muito o que comentar. Deixo que ele mesmo o diga (mesmo, talvez, com um gosto de chicória na boca):

O excesso de leitura tira do espírito toda a elasticidade, da mesma maneira que uma pressão contínua tira a elasticidade de uma mola. O meio mais seguro para não possuir nenhum pensamento próprio é pegar um livro nas mãos a cada minuto livre.

Por isso é tão importante, em relação ao nosso hábito de leitura, a arte de não ler. Ela consiste na atitude de não escolher para ler o que, a cada momento determinado, constitui a ocupação do grande público. […] Basta nos lembrarmos de que, em geral, quem escreve para os tolos encontra sempre um grande público.

Para ler o que é bom uma condição é não ler o que é ruim, pois a vida é curta, o tempo e a energia são limitados.

Sobre a escrita

A suposta arte de ler, que Süssekind encontrou escrita nas entrelinhas dos originais dea ser sucinto, objetivo e econômico nas palavras. Então, páro por aqui, como um verdadeiro artista. Schopenhauer, se resumem

Usar muitas palavras para comunicar poucos pensamentos é sempre o sinal inconfundível da mediocridade; em contrapartida, o sinal de uma cabeça eminente é resumir muitos pensamentos em poucas palavras.

A lei da simplicidade e da ingenuidade, já que essas qualidades combinam com o que há de mais sublime, vale para todas as belas artes.

A autêntica concisão da expressão consiste em dizer apenas, em todos os casos, o que é digno de ser dito, com a justa distinção entre o que é necessário e o que é supérfluo, evitando todas as explicações prolixas sobre coisas que qualquer um pode pensar por si mesmo.

De Marcos Bagno a Arthur Schopenhauer: uma distância de apenas algumas cotas

Muito se tem falado da discriminação racial, que passa pelas oportunidades de emprego e formação, pelos atos do dia-a-dia e até pela linguagem.

Schopenhauer tem uma declaração incômoda, mas bastante lógica, a respeito da linguagem discriminatória e dessas bobagens que às vezes são afirmadas, em nome do politicamente correto. Nesse sentido, até mesmo Marcos Bagno, autor de Preconceito Lingüístico, pode-se sentir recompensado nas palavras do autor alemão.

Não foi a palavra que levou à desvalorização da coisa, mas o contrário.

Arthur Shinyashiki

Em alguns pontos do livro, de tão livremente escrito, sem nenhum peso na consciência schopenhauriana, o autor descamba para uma auto-ajuda bem característica destes tempos hodiernos.

Tudo com a ironia bem-humorada característica do autor. Mas até que faz sentido.

A verdadeira excelência só pode ser alcançada, em obras de todos os gêneros, quando elas forem produzidas em função de si mesmas e não como meios para fins ulteriores.

Quando, em certa ocasião, temos de tomar uma decisão, não podemos nos sentar por quanto tempo quisermos, refletir sobre os motivos e só então decidir, pois com freqüência a nossa capacidade de reflexão não consegue se fixar no assunto justamente nesse momento, mas escapa para outras coisas. E muitas vezes a culpa é da nossa contrariedade na ocasião. Nesses casos, não devemos forçar nada, apenas aguardar que a disposição propícia também se apresente por si mesma. Isso acontecerá e se repetirá, muitas vezes, de modo imprevisível, e cada disposição diferente, em uma ocasião diferente, lança uma outras luz sobre o assunto. Esse avanço lento é o que se compreende pela expressão amadurecer as resoluções.

Quem não tem fel não tem entendimento, pois ele gera uma certa acrimônia que, tanto na vida quanto na arte e na literatura, suscita necessariamente e a cada dia a censura e o escárnio íntimos a respeito de milhares de coisas, impedindo-nos justamente de imitá-las.

Moisés Schopenhauer

Repito: vocês nunca perdem tempo em ficar lendo o Mosaico.

Muito pêlo contrário: lendo-o, vocês são embebidos em pura ceramida, adquirindo fortíssimas raízes capilares.

Schopenhauer que o diga:

A peruca é o símbolo mais apropriado para o erudito puro. Trata-se de homens que adornam a cabeça com uma rica massa de cabelo alheio porque carecem de cabelos próprios.

Quem não entender clicará.

Ah, o amor… ou Amar é…

Mais um autor (além daquele grego) que deixa transbordar todo o amor do seu coração em palavras derretidas pelo fogo da paixão em um pedaço de papel.

A presença de um pensamento é como a presença de quem se ama. Achamos que nunca esqueceremos esse pensamento e que nunca seremos indiferentes à nossa amada Só que longe dos olhos, longe do coração! O mais belo pensamento corre o perigo de ser irremediavelmente esquecido quando não é escrito, assim como a amada pode nos abandonar se não nos casamos com ela.

No fim das contas, a arte de escrever é o que menos importa em tudo isso. Afinal, só escreve quem ama – pois o pensamento é o amor. E essa arte, ah!, só quem ama compreende…

E tenha Schopenhauer dito.

2 comentários:

  1. Peguei emprestado na biblioteca hoje este livro, foi a razão de encontrar seu blog, pois procurei pelo título e cheguei a este espaço que por sinal é muito bom. Continue incrementando! Parabéns! Sonia

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  2. Uauuuu.......postagem destruidora e salutar!!!!

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